O ano era 2016. Sentado no auditório cheio do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, ouvia o Professor Dr. Flávio Pechansky, Diretor do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas do HCPA/UFRGS. Enquanto mostrava os resultados dos testes com o “drogômetro”, ele contava sobre sua experiência ao dirigir em uma estrada no Canadá alguns anos antes. Tamanha fora sua surpresa (e apreensão) ao se deparar com uma placa dizendo “Atenção! Esta rodovia pode estar sendo monitorada por drones”. Segundo ele, seu comportamento mudou instantaneamente pela simples possibilidade de estar sendo vigiado.
Desde o dia 1º de abril de 2022, passou a vigorar a Resolução 909 do CONTRAN, a qual passa a permitir o uso de videomonitoramento para a fiscalização viária. Sobre isso, o grande amigo, Professor Carlão, do Canal Manual do Trânsito, postou recentemente esse vídeo extremamente didático e esclarecedor:
Embora a Resolução nº 532/2015 do Contran, que alterou a Resolução nº 471/2013, já previsse a utilização de videomonitoramento para fiscalização, uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) proibiu o uso de videomonitoramento na fiscalização de infrações cometidas no interior dos veículos nas vias urbanas.
A ação foi revertida pelo TRF5 no último mês de fevereiro. Ela sustentava que o uso das câmeras violaria direitos fundamentais relativos à intimidade e à vida privada.
Justificativa que remete a um artigo que compartilhei há algum tempo, no qual abordo a ideia de que muitas pessoas transformam seus carros em extensões de suas próprias casas.
Ainda que os veículos sejam propriedades privadas, devemos sempre ter em mente que eles são utilizados em espaços público, de uso comum. Mesmo assim, quando a discussão tomou forma, não pude me privar de lembrar do clássico da literatura 1984, do grande escritor britânico George Orwell. Nele, Orwell aborda as distopias de uma sociedade fictícia onde imperam o controle e o totalitarismo.
No entanto, em um trânsito onde o que impera é o descontrole, onde cerca de 1,3 milhões de pessoas simplesmente se matam anualmente, mas que só viram notícia quando se trata de um ex-BBB, não seria interessante um trânsito um pouco mais orwelliano, por assim dizer? Aliás, Big Brother (ou Grande Irmão) foi uma entidade criada justamente por Orwell em 1984 para ilustrar o controle totalitário exercido pelo estado sobre a população. Não sei se monitoramento constante tem nos demais condutores o mesmo efeito que teve no Professor Pechansky. No entanto, se o intuito for “virar o jogo” será bem vindo. E, além disso, se diminuir a mortalidade que assola nosso país, particularmente, sou a favor até mesmo do uso de VAR!
Formado em Psicologia pela Unisinos, atua desde 2009 como Agente de Fiscalização de Trânsito e Transporte na EPTC, órgão Gestor do trânsito na cidade de Porto Alegre.