O rápido crescimento no uso de veículos motorizados de duas rodas durante a pandemia foi um desdobramento quase que natural do medo de se contaminar nos transportes públicos e da demanda pelos serviços de delivery. Em alguns países, como no Brasil, resultou na elevação da curva de lesões e mortes provenientes de acidentes de trânsito.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, OMS, em média morrem todos os anos um milhão duzentas e cinquenta mil pessoas em acidentes que considera em sua maioria previsíveis e evitáveis. Ou como afirma o Dr. Dário Birolini, Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com mais de 300 trabalhos científicos publicados: “o acidente de trânsito, em grande parte, precisa ser considerado como uma doença e como tal deve ser tratado”.
Segundo o jornal O GLOBO em matéria de Emily Nery publicado em setembro de 2021, o número de internações de motociclistas envolvidos em acidentes bateu recorde nos sete primeiros meses do ano. Ao todo, foram registrados 71.344 ocorrências, número 14,3% maior do que em 2020 e 8,3% mais alto que o computado em 2019. Esse meio de transporte que se intensificou durante a pandemia representa 54% de todos os sinistros de trânsito no Brasil.
Estudo divulgado pela Associação Brasileira de Medicina do Tráfego - ABRAMET alerta sobre a crescente taxa de acidentes com motos e as graves consequências que traz para o sistema de saúde pública. Além dos danos – muitos deles irreversíveis – estima-se que o Sistema Único de Saúde - SUS, tenha gasto R$ 107,9 milhões para tratar motociclistas que sofreram traumas entre janeiro e julho de 2021.
Deve-se considerar que a maioria dos condutores/vítimas vem de famílias de baixa e média renda e estão no auge da juventude. Tem seus sonhos interrompidos por essa doença que muitos insistem em chamar de acidente de trânsito.
Embora o Brasil tenha um Código de Trânsito que entre outras coisas regulamenta o limite de velocidade, obriga o uso de capacetes e cintos de segurança, considera crime dirigir embriagado, protege o pedestre, prevê a educação para o trânsito com recursos financeiros generosos provenientes das multas, apesar de tudo isso o Código não tem sido suficientemente implementado e a educação no trânsito não passa de uma quimera, o sabe com quem estás falando continua prevalecendo e o tema trânsito - na maioria das vezes, fora legitimas exceções - só frequenta o ambiente parlamentar para atrair holofotes e votos.
O caminho mais curto e direto para controlar a doença do trânsito é parar de fazer leis, decretos e resoluções. Basta cumprir com o que existe e está no Código de Transito Brasileiro, Lei 9503 de 1997. E, tudo deve começar pelo cumprimento do Artigo 320 que diz “A receita arrecadada com a cobrança das multas de trânsito será aplicada, exclusivamente, em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação de trânsito”.
O Código de Trânsito é muito claro sobre a educação e seus recursos financeiros, que aliás tem de sobra. O que falta é vontade e vergonha na cara dos políticos e administradores públicos de plantão.
Pode-se afirmar, categoricamente, que o Brasil só muda através de uma revolução pela educação, no mesmo caminho trilhado pelo Japão e pela Coréia do Sul. Tem que se ter a consciência que somos um país de analfabetos funcionais, agora ampliado pela pandemia e o estudo à distância em que, muitas vezes, não passa de um teatro onde uns fingem que ensinam e avaliam e outros que aprendem.
No trânsito esta situação é levada ao extremo pois os condutores irão operar máquinas e precisam conhecer a lei e respeitá-la em absoluto. Fora um fator fundamental, que é o desenvolvimento da chamada percepção dos limites aceitáveis de risco. Comparando condutores mais velhos com mais jovens percebe-se que os mais novos são quatro vezes mais propensos a se acidentar pois subestimam o risco e não reconhecem situações perigosas.
Entretanto os motoristas mais velhos necessitam compreender que apesar da experiência acumulada ao longo dos anos é necessário levar em conta as limitações que chegam naturalmente com o passar do tempo, evitando longas jornadas, dirigir à noite, com baixa luminosidade e instabilidade climática.
Se o acidente de trânsito é uma doença, como diz o respeitadíssimo médico Dário Birolini, o remédio está na formação dos condutores, na educação continuada para o trânsito e num programa permanente de redução de acidentes, verdadeira vacina de cidadania.
Por último, mas não menos importante salienta-se que para proteger sua vida e de sua família, em outubro, só vote em quem está de verdade comprometido em salvar o Brasil pela educação mas, alerte-se, que não seja ladrão, desses que a cada eleição disfarça a pele de lobo vestindo a de ovelha.
Doutor em Ciências Humanas e Mestre em História Econômica pela USP, criou e coordenou o Programa PARE do Ministério dos Transportes, foi Diretor do Departamento Nacional de Trânsito – Denatran, Secretário-Executivo do Gerat da Casa Civil da Presidência da República, Doutor Honoris Causa pela Faculdade de Ciências Sociais de
Florianópolis – Cesusc, Two Flags Post – Publisher & Editor-in-Chief.