Homenagem à um visionário
Em 1988 quando o Brasil se preparava para as eleições presidenciais que ocorreriam um ano depois, realizou-se em São Paulo, no Centro de Convenções Rebouças, o “I Simpósio Nacional de Transporte Ferroviário”. Na época tive a honra de presidir o Instituto Ferroviário de Estudos Avançados – IFEA, e testemunhar um momento singular da vida brasileira.
Necessário se faz destacar algumas das conclusões do evento e entre as presenças ilustres, a de Raimundo Caramuru Barros, cuja memória aqui se reverencia. Profissional da Empresa Brasileira de Planejamento em Transporte, GEIPOT e relator daquele evento nacional.
Em uma das mesas redondas que presidiu, Raimundo Caramuru Barros afirmou que, além de todos os conhecidos benefícios do transporte ferroviário, devia-se destacar um que normalmente fica a margem dos debates: a relação entre transporte ferroviário e acidentes rodoviários de trânsito.
O experimentado técnico do GEIPOT demonstrava que a expansão ferroviária viabilizaria a logística da produção brasileira, e simultaneamente retiraria das rodovias centenas de caminhões em desvio de finalidade, uma vez que, para ele, não caberia ao modal rodoviário o transporte de grandes cargas à grandes distancias.
Afirmava o preclaro conferencista que a recuperação e ampliação da rede ferroviária destinaria os caminhões para sua finalidade precípua que é o transporte de cargas entre pequenas e médias distancias. Para ele, isso significaria, acima de tudo, salvar vidas que precocemente são interrompidas pelo violento e desordenado trânsito.
O humanismo que marcou sua intensa vida pessoal e religiosa expressava-se, também, na sua vigorosa produção cientifica, colocando-o entre os destacados pensadores do setor de transportes.
Passaram-se 23 anos desde aquele evento histórico de 1998, até que o novel Ministério da Infra Estrutura, de forma inédita, adotasse três das conclusões do Primeiro Simpósio Nacional de Transporte Ferroviário, que são: concluir todas as obras iniciadas em governos anteriores, considerar o transito como o transporte em movimento, centralizando seus serviços na Infraestrutura, e dar prioridade ao transporte ferroviário.
O Ministro Tarcísio Gomes de Freitas, técnico jovem corajoso e não ideológico e nordestino como Caramuru, teve a fibra necessária para romper com os monopólios do antigo Ministério do Transporte e seus lobbies carcomidos e corruptos.
Assim, através do Decreto 10.788 de 6 de setembro de 2021 criou-se, no âmbito do Ministério da Infraestrutura, a Secretaria Nacional de Trânsito - SENATRAN. Entre suas atribuições está criar procedimentos para aprendizagem e habilitação de condutores, o registro e licenciamento de veículos, além de campanhas educativas de trânsito.
Por outro lado, o ministro da Infraestrutura, assumiu concluir as obras paradas antes de iniciar as novas, ou como afirmou recentemente à Gazeta do Povo, “não podemos reinventar o Brasil a cada quatro anos. Infraestrutura é uma questão de Estado, é uma questão de longo prazo". Assim também cumpriu com outro dos postulados técnicos do I Simpósio Nacional de Transporte Ferroviário de 1998.
O transporte ferroviário, colocado no limbo da ferrugem nas últimas duas décadas, voltou de fato, a ser tratado como prioridade. Através da Medida Provisória 1065 editada em 2/9/21, tornou possível construir novas ferrovias por meio de autorização simplificada, sem leilões de concessão. Uma vez rompido os laços do atraso, o Ministério de Infraestrutura recebeu pedidos para a construção de 3,3 km de novas ferrovias, com investimentos previstos de R$ 53 bilhões ao longo dos próximos anos.
As novas ferrovias atravessarão cidades de nove estados: Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Piauí e São Paulo. O modelo é semelhante ao que já existe na exploração de infraestrutura em setores como telecomunicações, energia elétrica, portos e aeroportos. Além disso, outros trechos ferroviários, como os da Ferrovia Norte Sul, que fora motivo de acalorados debates em 1998, estão sendo concluídos.
Finalmente, em homenagem póstuma a Raimundo Caramuru Barros, grifar o que dizia de que “construir ferrovias é também salvar vidas”.
Doutor em Ciências Humanas e Mestre em História Econômica pela USP, criou e coordenou o Programa PARE do Ministério dos Transportes, foi Diretor do Departamento Nacional de Trânsito – Denatran, Secretário-Executivo do Gerat da Casa Civil da Presidência da República, Doutor Honoris Causa pela Faculdade de Ciências Sociais de
Florianópolis – Cesusc, Two Flags Post – Publisher & Editor-in-Chief.