Reflexões Sobre o Trânsito e os Valores Sociais
O trânsito é, indiscutivelmente, o reflexo de uma sociedade. É através dele que podemos observar e analisar os valores que as pessoas praticam no seu dia a dia. Não é exagero afirmar que, nas ruas, sob o véu do anonimato, revela-se o caráter de uma nação em um dado momento de sua história.
É motivo de grande preocupação, talvez até alarme, observar até onde chegamos! Note-se que o problema não reside apenas na falta de respeito às leis, mas na desconsideração pelos direitos alheios, pondo em risco a integridade física e a vida dos cidadãos, seja nas vias ou nas calçadas.
Nas últimas duas décadas, o trânsito no Brasil tornou-se notavelmente mais perigoso. Agravantes dessa situação são mitigados apenas pelos avanços tecnológicos em segurança veicular e pela fiscalização eletrônica. No entanto, é crucial destacar a vulnerabilidade de ciclistas, motociclistas e, principalmente, pedestres, que se encontram na linha de frente deste cenário beligerante.
As causas desta deterioração são múltiplas e complexas. Algumas são visíveis e amplamente reconhecidas, enquanto outras, mais profundas e estruturais, exigem uma investigação meticulosa, pois fogem ao alcance do controle e repressão institucionais.
Vivemos em uma era de transição, onde valores geracionais estão em constante evolução, um processo natural na marcha da história. Nossos antepassados também passaram por transformações significativas, mantendo, contudo, seus valores culturais, ideológicos e morais, legando-os às futuras gerações.
Hoje, entretanto, enfrentamos desafios distintos. As mudanças na estrutura familiar refletem a dinâmica social contínua. As famílias tornaram-se mais diversas e os papéis de gênero mais flexíveis, com homens e mulheres partilhando responsabilidades domésticas e profissionais de forma mais equitativa. Apesar destas transformações, valores fundamentais como amor, respeito e apoio mútuo permanecem como pilares essenciais.
Defender a diversidade é uma coisa; impor um modelo de sociedade baseado em direitos de minorias ou em sistemas autoritários é outra, muito diferente. Esta problemática é exacerbada quando estratégias de imposição de valores são aplicadas em ambientes educacionais, desviando o foco do desenvolvimento dos estudantes para uma doutrinação que questiona seus valores familiares, culturais e religiosos.
O cenário se complica ainda mais com a atuação de uma mídia que, frequentemente alinhada a interesses específicos, promove uma visão de mundo unilateral, dividindo a sociedade em 'nós contra eles', e utilizando o entretenimento para reforçar valores contrários aos que foram transmitidos pelas famílias.
As falhas não se limitam aos cidadãos, mas se estendem às autoridades e seus agentes, que, por vezes, falham em cumprir suas obrigações legais por medo, desinteresse ou ceticismo quanto à eficácia das medidas legais.
Segundo Émile Durkheim, pioneiro da sociologia moderna, tanto a educação quanto o trânsito podem experimentar um estado de anomia, caracterizado pela confusão e enfraquecimento das normas sociais. Este estado pode conduzir a um aumento do desalinhamento social e à desregulação, variando de isolamento social a um crescimento da criminalidade.
É fundamental reconhecer que a solução para a violência no trânsito não se encontra nas ruas, mas sim nas urnas. O Brasil vive um momento de estresse intenso, oriundo de forças internas e externas.
Os jovens que se acidentam fatalmente, seja em motocicletas de baixa cilindrada ou bicicletas, muitas vezes são duplamente vítimas, tanto das circunstâncias quanto de ataques a valores familiares essenciais, impulsionados por segmentos da mídia comprometidos com agendas específicas.
Apesar dos desafios, há motivo para esperança. A ordem pode, de fato, emergir do caos, pois é através da educação, da ética e do exemplo que se extrai harmonia e entendimento. A solução começa em casa, nas interações cotidianas, no local de trabalho e, crucialmente, no voto. A mudança começa com você.
Doutor em Ciências Humanas e Mestre em História Econômica pela USP, criou e coordenou o Programa PARE do Ministério dos Transportes, foi Diretor do Departamento Nacional de Trânsito – Denatran, Secretário-Executivo do Gerat da Casa Civil da Presidência da República, Doutor Honoris Causa pela Faculdade de Ciências Sociais de
Florianópolis – Cesusc, Two Flags Post – Publisher & Editor-in-Chief.