Na parada de ônibus em frente ao BarraShopping, recém-saída da loja em que trabalhava – fazia seis meses; seu primeiro emprego – , Cristiane foi abordada por marginais, que exigiram o celular. Assustada, nervosa, a menina irritou um dos bandidos porque não conseguia encontrar o aparelho na bolsa e foi baleada no rosto, o que fez seu corpo sílfide desabar de costas sobre a calçada. Às 19h30, na avenida Chuí, bairro Cristal, morreu a jovem de 20 anos e, com ela, morreu mais do meu já pouco e antes tão ansiado desejo de voltar a esse lugar odioso chamado “lá fora”.
Nas palavras do jornalista e escritor gaúcho, Auber Lopes de Almeida, estão expressos sentimentos que assolam boa parte da sociedade: um misto de medo, indignação e impotência.
O transporte público coletivo ainda é a única opção de locomoção para a grande maioria das pessoas, mesmo com a atual crise do sistema de transporte. Já não bastasse a enorme evasão de passageiros devido a fatores como altas tarifas, irregularidade no cumprimento de horários, superlotação e falta de conforto, os usuários ainda têm que lidar com a violência.
Esse ocorrido que chocou os usuários de ônibus de Porto Alegre, como eu, me remete a uma reflexão que eu costumava trazer em algumas das minhas palestras.
Discutíamos, certa feita, um grupo de colegas e eu, justamente sobre o fator insegurança no uso do transporte público.
Lembro de um deles mencionar uma reportagem que havia assistido em um canal de televisão local. Nela, a repórter entrevistava na rua um especialista em segurança que fora desafiado a apontar ao vivo situações de risco à segurança. Eis que o especialista aponta, explicando estar ali uma pessoa em situação de risco. Ao virar a câmera, o cinegrafista foca em uma pessoa exatamente em uma parada de ônibus.
É inegável que exista de fato um risco de assaltos na utilização do transporte público. Mas será esse risco realmente maior que o risco de quem anda de transporte individual motorizado? Porque, da mesma forma, temos notícias de arrastões em engarrafamentos, assaltos em semáforos e sequestros-relâmpago a condutores.
A reflexão, diante disso, é:
A quem serve o sentimento de segurança? Seja ele real ou imaginário, quando se está atrás de um volante, num invólucro de metal, com vidros escuros completamente fechados? Quem se beneficia dessa insegurança sentida pelos usuários do transporte público?
Sou um defensor ferrenho da priorização do transporte público em detrimento ao individual, algo que procuro levar a cada palestra e curso que ministro. Entretanto, fatos como esse me colocam em um complicado dilema de tentar defender algo que está, a cada dia que passa, mais indefensável.
Formado em Psicologia pela Unisinos, atua desde 2009 como Agente de Fiscalização de Trânsito e Transporte na EPTC, órgão Gestor do trânsito na cidade de Porto Alegre.